O ano de 2016 se iniciou com
duros golpes sobre a economia nacional brasileira, dados pelo imperialismo
estrangeiro em conluio com as classes dominantes domésticas. Tais golpes, que geraram
um rastro de miséria e pobreza, desemprego, repressão e saque imperialista
sobre as empresas brasileiras e os recursos naturais de nosso solo, se
estenderam também pelos campos do país, contra as massas trabalhadoras rurais e
o movimento popular rural. Desde o início de 2015 já se vem notando um grande
recrudescimento na repressão contra os movimentos camponeses por parte da pistolagem
dos latifundiários e do paramilitarismo (a faceta "moderna" da velha
pistolagem coronelista, onde fazendeiros contratam empresas de segurança para perseguir,
torturar e assassinar lideranças de camponeses e povos originários), ambos em
conluio com o velho Estado brasileiro, seja através de sua conivência ou apoio
integral, quando, em momentos críticos dos conflitos agrários, este emprega
seus próprios braços armados com fins repressivos.
Em 2015, segundo dados parciais
da Comissão Pastoral da Terra, cerca de 50 militantes e lideranças camponesas,
ambientalistas e de povos originários foram assassinados. Foi o maior número de
assassinatos da década de 2010, e o maior desde o ano de 2004, quando 73
lideranças do movimento popular rural foram assassinadas. De 2004 até então
(fins de 2015), somam-se 450 lideranças populares rurais executadas. O objetivo
de tão grande derramamento de sangue não é outro senão o de inviabilizar ou
dificultar a ocupação de grandes latifúndios improdutivos por camponeses sem
terra, bem como retomadas de territórios ancestrais por populações originárias
- em suma, a reforma agrária - para a manutenção do poder semifeudal da classe
latifundiária sobre a terra e, também, para abrir campo para atividades
anti-econômicas e anti-desenvolvimento, como o monocultivo predatório orientado
para a exportação ou a extração parasitária de recursos naturais (a exemplo das
mineradoras). As várias formas de brutal violência contra os trabalhadores
rurais e populações tradicionais por parte da classe latifundiária e do
agronegócio estrangeiro, contudo, não vêm se resumindo a assassinatos. Os
ataques incluem também toda classe de intimidações, ameaças de morte, sumiços,
estupros, espancamentos, incêndios de casas e plantações, reintegrações de
posse emitidas por juízes comprados, prisões arbitrárias, etc.
LIDERANÇAS RURAIS MARTIRIZADAS ÀS
DEZENAS
O ano de 2016 mal se iniciou e já
faz jus a 2004 e 2015. Recordemos, então, alguns dos principais ataques
efetuados contra o movimento camponês do ano presente.
Alagoas: 22.01.2016: No assentamento Irmã Daniela, localizado na
zona rural do município de Japaratinga, região litorânea do estado, foi assassinado
Edmilson Alves
da Silva, dirigente camponês do Movimento de Libertação dos Sem
Terra (MLST), por dois pistoleiros que passaram pelo assentamento em uma moto.
Edmilson Alves dirigia ocupações de terras por toda a zona da mata alagoana,
denunciava crimes ambientais e de trabalho escravo praticados por usineiros de
toda a região, configurando-se como destacado dirigente das massas
trabalhadoras rurais do estado de Alagoas. Seu assassinato foi prontamente
acompanhado de uma manifestação por parte de camponeses do MLST, que fecharam
rodovias do município em protesto contra seu martírio.
Amazonas: 22.01.2016: As cento e sessenta famílias posseiras do
Acampamento Malocão, localizado na zona rural do município de Boca do Acre, sofreram
uma intimação arbitrária por parte de policiais e funcionários públicos.
Acompanhando os policiais e os funcionários públicos, estava um capataz da
Fazenda Palotina (sobre a qual foi erguido o acampamento) fortemente armado.
Sob alardes arbitrários como supostos "crimes ambientais" cometidos
pelos camponeses posseiros do acampamento, foram presos três lavradores acampados,
incluindo Jhonny
Teixeira, que havia
levantado voz contra o ataque dos policias no acampamento.
28.01.2016: As Polícias Militar e
Civil do Amazonas foram novamente ao Acampamento Malocão e, sem quaisquer
documentos legais, deram ordem de prisão aos posseiros da área, dizendo que
deveriam, todos, prestar depoimento em delegacia. Na ocasião, o lavrador Deuvancir de
Oliveira Ventura foi
espancado pelos policiais, além de haver sofrido agressões verbais.
Bahia: 04.02.2016: Em Jaguaripe, município do Recôncavo Baiano, foi
assassinado o professor aposentado Marcus Vinicius de Oliveira, que atuava na defesa
de uma comunidade rural que permanecia sob ataque de fazendeiros locais. Sua
morte rendeu enorme comoção por parte de populações indígenas e da comunidade
acadêmica.
Maranhão: 01.02.2016: A lavradora Francisca das Chagas Silva,
sindicalista rural do STTR de Miranda do Norte (Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Miranda do Norte), ligada à CTB (Central dos
Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), foi executada com requintes de
crueldade por pistoleiros neste mesmo município. Seu cadáver foi encontrado
somente dois dias depois de seu assassinato, estando despido, com inúmeras
perfurações e indícios de estupro e estrangulamento. Francisca era quilombola
do povoado Joaquim Maria, de Miranda do Norte. Havia participado das
mobilizações da Marcha das Margaridas em agosto de 2015, em Brasília, e era uma
conhecida lutadora pelos direitos dos povos do campo na região.
Minas Gerais: 19.01.2016: O dirigente camponês Osmar Rodrigues, presidente da
Associação Comunitária do Acampamento Unidos com Deus Venceremos, localizado na
zona rural do município de Pedras de Maria da Cruz, norte do estado, sofreu um
atentado enquanto este retornava durante a noite para sua casa, localizada na
sede do município. Osmar sofreu golpes à pauladas na cabeça por parte dos
pistoleiros que o atacaram, e atualmente se encontra internado em estado grave,
em coma, num CTI da cidade de Montes Claros. Osmar Rodrigues é um dirigente da
Liga dos Camponeses Pobres (LCP) e irmão do ex-dirigente da LCP, Cleomar
Rodrigues, que foi assassinado em outubro de 2014 por pistoleiros bancados por
fazendeiros da região.
Pará: 03.02.2016: Uma grande manifestação camponesa foi realizada
em conjunto pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e a APPGA
(Associação dos Pequenos Produtores da Gleba Ampulheta) em frente à Fazenda
Santa Clara, zona rural de Marabá, denunciando-a como um grande latifúndio
improdutivo conformado a partir de terras griladas da União pelo fazendeiro
Damião Macedo, e denunciando também os crimes ambientais da fazenda, que
estaria contaminando o Rio Gelado por ter em suas terras uma das maiores
barragens de rejeito do país. A manifestação dos trabalhadores rurais foi
duramente reprimida pela Polícia Militar, que terminou com um saldo de cento e
vinte trabalhadores rurais detidos e escoltados até a Delegacia de Parauapebas,
trinta e cinco feridos, sete presos e três desaparecidos.
12.02.2016: No centro do
município de São Domingos do Araguaia, região do Bico do Papagaio, foi
executado com seis tiros, às 6h da manhã, o dirigente camponês Luiz Antônio Bonfim,
conhecido como "Luiz Dentista" pela população local. Luiz Bonfim era
presidente do PCdoB (Partido Comunista do Brasil) de São Domingos do Araguaia e
dirigia, com apoio do MST, um processo de luta camponesa no povoado Tabocão, em
Brejo Grande do Araguaia, com ocupações de terras improdutivas e griladas por
fazendeiros.
27.02.2016: Pistoleiros balearam
e feriram gravemente o líder camponês Ronair José Lima, sua esposa e sua filha quando estes se deslocavam de
moto para uma reunião da Associação dos Trabalhadores Rurais de São Félix do
Xingu. Ronair e sua esposa correm sério risco de morte, enquanto sua filha está
sendo operada dos ferimentos que sofreu após ser alvejada no braço. Ronair,
dirigente da FETAGRI (Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do
Pará), há anos sofria ameaças de morte por dirigir 150 famílias camponesas num
processo de ocupação de terras improdutivas na área de São Félix do Xingu
conhecida como Divino Pai Eterno. Durante um ataque realizado por pistoleiros
contra a área Divino Pai Eterno em novembro de 2015, sua casa, junto com as de
seus vizinhos, foi saqueada e depredada pelos bate-paus do latifúndio (nesta
ocasião, o lavrador Valvídio foi assassinado). Ainda que recebendo tão sérias
ameaças de morte, os serviços de proteção a defensores dos direitos humanos
nada fizeram para protegê-lo mesmo que tenham sido acionados um sem número de
vezes, mostrando a completa conivência do Estado reacionário brasileiro com as
arbitrariedades da classe latifundiária. Somente no conflito agrário em torno
da área Divino Pai Eterno, cerca de cinco líderes camponeses foram executados
nos últimos oito anos.
Rondônia: 07.01.2016: Nilce de Souza Magalhães, pescadora e militante do MAB (Movimento dos Atingidos
por Barragens) num acampamento de famílias pescadoras atingidas pela Usina
Hidrelétrica de Jirau, localizado na região de Mutum Paraná, foi tida como
desaparecida após ser vista pela última vez
cozinhando no barraco do acampamento onde vivia com seu marido, por
volta do horário de meio-dia. Após alguns dias, foi confirmado seu assassinato
por pistoleiros bancados por grandes empreendimentos de hidrelétricas.
23.01.2016: Lideranças do
Acampamento Paulo Justino, localizado na zona rural de Jaru, nas proximidades
do Vale do Jamari, foram executadas à luz do dia na sede municipal de Jaru por
pistoleiros armados. Eram os trabalhadores rurais Enilson Ribeiro e Valdiro Chagas, militantes da LCP (Liga dos Camponeses
Pobres) que participavam do processo de estruturação do recém erguido
acampamento (cujo nome foi escolhido em homenagem ao ex presidente da
Associação Vladimir Lênin, assassinado por pistoleiros em Rondônia no ano de
2015) e propagandeavam a luta pela reforma agrária na região. Além de
trabalhadores rurais, ambos eram pais de família. Órgãos de comunicação da LCP
vêm desde então denunciando que os pistoleiros responsáveis pelos assassinatos
não apenas de Enilson e Valdiro, como também de vários outros militantes pela
reforma agrária no Vale do Jamari, vêm sendo recrutados nas fileiras da própria
Polícia Militar pelo tenente-coronel Enedy, este próprio que vem promovendo um
verdadeiro terror contra todo o movimento camponês na região, tendo em vista impedir
as ocupações de terras griladas e improdutivas.
31.01.2016: No dia 28 de janeiro,
camponeses posseiros organizados pela Liga dos Camponeses Pobres foram
despejados da Fazenda Tucumã após uma truculenta operação da Polícia Militar.
Quando cerca de cinco ex-acampados retornaram ao local para buscarem alguns
pertences deixados para trás durante a operação, estes foram abordados por uma
caminhoneta cheia de pistoleiros que abriram fogo contra os posseiros. Na
ocasião, os camponeses Alysson Henrique Lopes e Ruan Hildebrant Aguiar foram barbaramente assassinados. Os outros três
ex-acampados do grupo conseguiram fugir e denunciar o crime cometido. Alguns
dias depois, um corpo carbonizado suspeito de ser o cadáver de um dos jovens
assassinados foi descoberto dentro do carro utilizado pelos lavradores para
buscar pertences na área submetida à reintegração de posse.
O NECESSÁRIO CONTRA-ATAQUE DO MOVIMENTO CAMPONÊS
A questão agrário-camponesa no Brasil vem ganhando cada
vez mais centralidade, portanto, não apenas em aspectos econômicos, como também
em aspectos políticos necessários para a construção do movimento de massas
revolucionário. Desde a década de 1990, as classes dominantes brasileiras tiveram
a opção política de recorrer à agroexportação e à extração de recursos naturais
(em detrimento da industrialização) como forma de gerar superávits na balança
comercial brasileira e abrir ainda mais os mercados brasileiros para as grandes
transnacionais agrícolas que dominam todo o mundo capitalista e avançam
agressivamente para os países semicoloniais. Os desdobramentos não foram senão
o aumento dos conflitos agrários como resultado da "expansão da fronteira
agrícola", da grilagem de terras com conteúdo principalmente especulativo.
O ano de 2014, assim, testemunhou a participação de mais de 800 mil
trabalhadores rurais e populações originárias envolvidos 1286 conflitos
agrários (dos quais, mais de 1000 estiveram relacionados à posse da terra). Foi
o maior número de participações em conflitos agrários desde o ano de 2005,
quando mais de 1 milhão de trabalhadores rurais e populações originárias se
envolveram em cerca de 1900 conflitos agrários.
Porém, fato necessário de se notar em tais números é que estes
não representam um auge do movimento camponês: Apesar do aumento de pessoas que
tomam partes em conflitos agrários no ano de 2014, apenas 205 ocupações e/ou
retomadas de latifúndios ocorreram. Apenas 20 acampamentos rurais foram
erguidos. Tais números representam uma enorme queda se comparamos, por exemplo,
com o ano de 2003, quando, apesar da relativa proximidade numérica com o número
de trabalhadores que se envolveram em conflitos agrários em 2014 (cerca de 1,1
milhão de trabalhadores rurais participaram de conflitos agrários em 2003, em
comparação com cerca de 800 mil em 2014), foram erguidos 285 acampamentos
rurais por todo o Brasil e se realizaram 391 ocupações/retomadas rurais. Em
1999 e 2004, a rigor de comparação, 593 e 496 ocupações/retomadas rurais foram
realizadas, não obstante em 1999 o número de pessoas envolvidas em conflitos
agrários tenha sido de 700 mil (100 mil a menos que em 2014).
Tais fatos demonstram, indiscutivelmente, o aumento da
violência no campo praticada pelos grandes fazendeiros, pela pistolagem e pelo
Estado, em detrimento dos conflitos causados pela ação consciente, organizada e
deliberada do movimento popular rural. A violência anti-camponesa e
anti-indígena vem ganhando requintes de fascismo, quando nem mesmo lideranças
rurais ligadas a organizações e concepções ideológicas reformistas e
revisionistas vem sendo poupadas pelo latifúndio (a exemplo do assassinato de
militantes do PT e PCdoB no campo). A queda nas ocupações rurais, o relativo
enfraquecimento do principal movimento rural do país (o MST) e a efetividade da violência dos
latifundiários não pode ser dissociada justamente do predomínio destas mesmas
concepções errôneas no seio do próprio movimento camponês. Tais fatores não
podem ser também, igualmente, dissociados do difícil momento político pelo qual
nosso país vem passando, do avanço cada vez maior das seletas camarilhas
arquirreacionárias da grande burguesia compradora ligada ao imperialismo contra
o movimento popular, contra a soberania nacional e os direitos do povo
trabalhador.
Apesar dos grandes golpes sofridos pelo movimento
camponês, formas ainda que limitadas de resistência já foram ensaiadas pelo
campesinato trabalhador em 2016.
Em Atalaia, zona da mata de Alagoas, lavradores do Acampamento
São José (acampados há doze anos na Usina Ouricuri) resistiram e barraram a uma
violenta tentativa de despejo por parte da Polícia Militar através de um grande
processo de organização e resistência, com apoio de diversos movimentos
democráticos, entidades sindicais e estudantis, incluindo feirantes e
comerciantes da região que se beneficiavam com a produção dos camponeses
acampados.
Em Rianópolis, região central de Goiás, cerca de 1,5 mil
camponeses organizados pelo MST ocuparam a Fazenda Sibéria, improdutiva e de
aproximadamente 2 mil hectares.
No mês de março, em Quedas do Iguaçu, região central do
Paraná, 700 famílias de lavradores sem terra organizados pelo MST ocuparam as
Fazendas Dona Hilda e Santa Rita, duas áreas de cerca de 2,3 mil hectares
grilados pela madeireira Araupel. Tal ocupação tenderá a fortalecer a luta
iniciada pelas cerca de 3 mil famílias camponesas que, em meados de 2014,
também em Quedas do Iguaçu e no município de Rio Bonito, ocuparam uma imensa
área de 35 mil hectares grilada pela empresa Araupel.
Tais ações de resistência aos ataques anticamponês e
anti-indígena, ainda que louváveis, seguem sendo muito inferiores diante da
gravidade dos ataques cometidos pelos bate-paus da classe latifundiária.
Somente o engajamento dos comunistas no seio do movimento camponês, tarefa esta
durante muitas décadas relegada a segundo plano pelos oportunistas de direita e
"de esquerda", mas que agora assume o caráter de tarefa central e de
primeiro plano por parte dos comunistas, pode elevar o movimento camponês à
altura que este necessita para assumir uma efetiva postura defensiva e ofensiva
diante do avanço reacionário a nível a nacional e concluir a principal tarefa
da Revolução Brasileira em sua etapa atual que, junto com a libertação da nação
brasileira da opressão do imperialismo norte-americano, é a conclusão da
reforma agrária, com a liquidação completa da propriedade latifundiária da
terra.
Rechacemos os ataques
anti-camponês e anti-indígena!
Demonstremos nossa
efetiva solidariedade ao movimento camponês organizado e a todos os trabalhadores
da terra!
Concentremos nossos
esforços para efetivar a aliança operário-camponesa!
Reorganizemos o Partido
Comunista do Brasil, vanguarda das massas trabalhadoras rurais e urbanas!
UNIÃO RECONSTRUÇÃO COMUNISTA
10 de março de 2016
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